sábado, 21 de janeiro de 2012

(Que espécie de justiça reclamou o Senhor para Ele, quando vergava sobre a cruz?)

...
Nesse ponto, a interlocutora, parecendo melindrada, acentuou asperamente:
- Suas palavras são filhas da pregação religiosa, mas eu estou à procura da
justiça...

E com riso irônico, terminava:
- Aliás, da justiça apregoada por Jesus.

O missionário não se exaltou ante o sarcasmo do gesto que acompanhou a
observação ingrata e disse-lhe, bondoso:
- A justiça!  quantos crimes se praticam no mundo em seu nome! quantos
homens e mulheres, que, em procurando fazer justiça sobre si mesmos, nada
mais fazem que incentivar a tirania do «eu»? Refere-se a irmã ao Divino
Mestre. Que espécie de justiça reclamou o Senhor para Ele, quando vergava
sobre a cruz? Nesse sentido, minha amiga, o Cristo nos deixou normas de que
não deveremos esquecer. O Mestre mantinha-se vigilante em todos os atos
alusivos à justiça para os outros. Defendeu os interesses espirituais da
coletividade, até a suprema renunciação; entretanto, quando surgiu a ocasião
do seu julgamento, guardou silêncio e conformação até ao fim. Naturalmente
não desejou o Mestre, com semelhante atitude, desconsiderar o serviço
sagrado dos juizes retos, no mundo carnal, mas preferiu adotá-la,
estabelecendo o padrão de prudência para todos os discípulos de seu
Evangelho, nas mais diferentes situações. Ao se tratar de interesses
alheios, minha irmã, devemos ser rápidos na justificação legitima;
entretanto, quando os assuntos difíceis e dolorosos nos envolvem o «eu»,
convém moderar todos os impulsos de reivindicação. Nem sempre a nossa visão
incompleta nos deixa perceber a altura da dívida que nos é própria. E, na
dúvida, é lícita a abstenção. Acredita que Jesus tivesse algum débito para
merecer a sentença condenatória? Ele conhecia o crime que se praticava,
possuía sólidas razões para reclamar o socorro das leis; no entanto,
preferiu silenciar e passar, esperando-nos no campo da compreensão legítima.
É que o Mestre, acima do «olho por olho» das antigas disposições da lei,
ensinou o «amai-vos uns aos outros», praticando-o invariavelmente. Confirmou
a legalidade da justiça, mas proclamou a divindade do amor. Demonstrou que
será sempre heroísmo o ato de defender os que merecem, mas se absteve de
fazer justiça a si mesmo, para que os aprendizes da sua doutrina estimassem
a prudência humana e a fidelidade divina, nos problemas graves da
personalidade, fugindo aos desvarios que as paixões do «eu» podem
desencadear nos caminhos do mundo.

(de "Missionários da Luz". André Luiz/ Chico Xavier. FEB)